Samstag, 26. Januar 2008

A direcção do sangue


Quando se viaja sozinho
pelas imagens que perduram
as evocações ganham um modo tão real
A mancha ténue dos arbustos
indica o caminho para o regresso
que nunca há
o mar ficou de repente perto
sobre esta praia travámos lutas
para as quais só muito depois
encontramos um motivo
era à pedrada que nos defendíamos
do riso mais inocente
ou de um amor
Mas aquilo que nunca esquecemos
deixa de pertencer-nos e nem notamos
Estamos sós com a noite
para salvar um coração

José Tolentino de Mendonça

Freitag, 25. Januar 2008










A verdade que pertence aos gestos
Ao menor dos nossos gestos
Antes de chegarem palavras que nos socorram
Ás vezes é a verdade de um amor.

José Tolentino Mendonça

Epigrama para uma terceira despedida














Eu vi a eternidade nos teus dedos!

Eu vi a eternidade, e amedrontou-me
saber, tão de repente, tais segredos.
— Eu não mereci, sequer, saber-te o nome.

David Mourão-Ferreira

Uma floresta pintada por Ilda David

















De instante para instante
identificam-se lacunas, espaços irremediáveis
distâncias:
é apenas uma parte
a experiência que fazemos
do que seja o tempo

Nesse descoberto que separa
um instante de outro
estendes o teu próprio corpo
nenhuma outra maneira
guardou o perfume da neve
sobre os muros
como se não fosse.

José Tolentino Mendonça

Sonntag, 20. Januar 2008

Entre-mundos












Minha terra
é lugar entre destinos
o espaço que fica entre o
partir e o chegar.

Minha língua
é som entre as palavras
a ideia que fica entre o
pensar e o falar.

Minha alma
é desejo entre metas
no tempo que fica entre o
que foi e o que será.

aa